sexta-feira, 28 de outubro de 2011

XX Congresso Anual da ABEM

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Poema de Aline Yasmin

deixe passar a ingratidão
ela mora na casa do medo
reside sozinha 
vizinha a escuridão
ela e meia dúzia de cães chucros
que desfilam impafiosos ao meio dia 

deixe passar a ignorância
ela não sabe por onde anda
mesmo que tenha certezas mas não as garanta

não ignore o erro
não será possível ver diretamente quem os acompanha 
mas se seguir seus movimentos 
pode ser que os passos revelem 
debaixo do manto
cambaleantes 
aqueles que o sustenta
podem ser numerosos e irreconhecíveis
porque andam em blocos
em máscaras que os cobrem invisíveis

não ignore o erro
nele está o acerto
nele está a resposta
que tanto procura
nos mudos ingratos
e também a certeza dos ignorantes


mas sobretudo 
nunca substime o sonho
que normalmente anda sozinho
parece frágil e arredio 
bradando em praças 
ou tímido falando aos ouvidos 
palavras incompreensíveis
reconheça o sonho
na rua 
nas esquinas da sua própria vida
ele quer companhia 
mas não oferece garantias
carrega com afinco 
uma imagem que figura paisagem
feita de um risco quase ilegível
é preciso ler nas entrelinhas
o sonho insone pode ser visto todos os dias
nisso ele se diferencia
ao contrário da ignorância 
é amigo do erro
não anda em matilhas
não se avizinha do medo
e não segue a esmo
um caminho vazio

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Gilsinho, Gildete e os dois otários. - Crônica de Alexandre Mignoni

Gilsinho Peixe Agulha (já - já explico), como ele mesmo se apresenta, é um camarada engraçado.  Nem nunca perguntei o porquê do apelido, nem precisava.  Conheci o caboco num curso que fizemos,  e nos tornamos amigos. Temos saído juntos pela noite paulistana faz um tempo, e estamos invictos.  Eu to desanimando, mas o Peixe parece cada dia mais motivado e com uma auto-estima indestrutível.

O sujeito tem as canelas curtas, mas a coxas grossas (ui!).  Daí ele vai subindo gordo até o pescoço, que é fino e comprido. Mais ou menos um metro de pescoço. Sério. Acrescente uma cabeça muito pequena.  A menor cabeça do mundo.  Ele, inclusive,  não encontra um fone de ouvido que se encaixe. Fica tudo folgado. Então, o conjunto não é lá muito harmonioso.  Tanto que se não fosse peixe agulha, o apelido dele poderia ser tranqüilamente salsichão no palito ou mesmo bombom serenata. 
 
Malaco, o cabra conhece todas as bocas e atalhos da noite paulistana. Porteiros, seguranças, garçons, motô de taxi (muito importante), promoters e até vendedor de flor (com esses ele tem até conta corrente). Freqüenta a noite com a desenvoltura e de um adolescente e a saliência ansiosa de uma virgem.  Guerreiro, nunca desiste antes da cinco da manhã.  Lá pelas três ele vai ficando bêbado e começa a falar um espanhol estranho, como se estivesse uma raquete de tênis na boca.  E tome “cevejita”, “uiskito” e “muchachas”.  Nesse estágio ele compra flores e aborda qualquer uma, independe da circunferência, altura, dos trajes ou da idade. Tanto que por mais de uma vez tive que interromper eloqüentes diálogos, com direito a mãozinha na cintura, com uma a tiazinha que vigia carro.  Quando a gente paga para entrar então, o sujeito não admite sair sem uma recompensa.
 
Mas ele é solidário na balada (paulista eu?). E isso é extremamente importante na noite.  Numa dessas, quando heroicamente recusei a minha primeira incursão pelo universo feminino da terceira idade (eu ainda acredito) , ele prontamente dispensou a tia da minha amiga, e saímos no zero mais uma vez. Já fomos a todos os tipos de eventos: rave, festival de forró, bingo de caridade, roda de samba, show de rock e até numa (nesse dia eu voltei da porta), seresta. Fiquei esperando o Gilsinho no carro e quando ele chegou sozinho, eu disse: chega velho, num tá dando certo, tamo gastando uma grana preta, e nada até agora.  Vamos mudar a abordagem, tentar outra coisa, inventar umas mentiras, sei lá. . .E ouvi como resposta uma das frases mais otimistas e positivas de todos os tempos: calma, é questão de tempo. E outra coisa, veja pelo lado positivo, brother. Quando eu ia perguntar que lado positivo ele via o peixe agulha mandou a pérola: se ainda não comenos ninguém, pelo menos ninguém comeu a gente. É, ta certo.
 
Sabadão, to em casa estirado no sumiê (lembra, dessa?), me aparece meu camarada trajando um abadá do bloco Tatu Malokêro, meia verde até o meio das canelas, um tênis preto estranho, cerveja Cintra na mão, me botando pilha pra ir no Sampa Folia,  evento que estava no rolando no bairro do Tatuapé, com o patrocinado do energético Ligadão. Foi muito pra mim, declinei.   Meio puto, repetindo a toda hora... vai sacanear, vai sacanear, vai correr do pau?  O Peixe saiu pisando duro, mas foi pro combate. E eu, entre entediado e arrependido, mudei de roupa e saí pra comprar um livro qualquer, numa livraria bem perto casa dele.
 
Nunca vi um lugar com tanta gente na minha vida. Se o livro remete ao silêncio, estava eu no lugar errado. Tinha tanta gente que eu me arrependi de não ter saído com o Peixe no Tatu Maloqueiro. Mas, tudo bem. Achei um canto sossegado, escolhi o livro e fiquei esperando o camarada para finalizar o atendimento. Tava ali, só enfeitando cabo de rodo, quando percebo vindo em minha direção dessas mulheres pras quais é muito difícil encontrar uma definição. Deixa ver... era uma Lolita (tem isso, num tem)? Mas era uma Lolita-Thainá, manja? Thainá é aquele tipo definido na crônica impagável sobre os Los Hermanos: sainha neo-hippie, sandalinha rasteirinha com coração, bolsinha de feira de artesanato assim cruzada, pulseirinhas coloridas e cabelinho lisinho. Linda, linda, maravilhosa.
 
Se aproximou, tocou meu braço com a pontinha dos dedos (que dedos, que pontinhas) e disse: você pode ver o preço pra mim, por favor?  Putz! Eu todo languido e ela tava só me confundindo com o vendedor. Que merda! Apontei aquele fálico e estranho objeto para o código de barras e bicho fez pííí. Pelo borrão que quase vi, percebi que estava sem óculos, mas chutei qualquer valor terminado em noventa e entreguei de volta o livro pra ela. Foi quanto eu li o título: Como Seduzir Homens Mais Velhos. Caralho! Voltei pro jogo, pensou o adulto sub cinqüenta.  
 
Ai, que fora que dei. Desculpa, desculpa! Neste exato momento, bem no pá do desculpa, ele ajeitou o cabelo atrás da orelha, pegou? Perfeita.  Mais puto do que sogrão conhecendo o genro-músico-tatuado, murmurei um tudo bem e me preparei pra bater em retirada. Humilhado, sangrando. Mas, poxa, eu já fui bom nisso.  Posso ser ruim de “entrada”, mas eu desenvolvo bem na conversa. Com o coração aos pulos, decidi arriscar. Num tinha ninguém vendo mesmo: tenho certeza de que você não vai aprender nada como esse livro! Foi boa essa num foi?  Ai, por quê? Ela sempre coloca esse ai antes de todas as frases.  Só a sua presença é o bastante (putz, que cantada foda). Confesso, eu estava nervoso, nervoso e vermelho. Vermelho não, grená. Eu tava grená, que por sinal já foi chamado “maravilha” e atualmente, com tanta cor nova, deve ser deep salmon.
 
Mas deu certo, ela perguntou que livro escolhi e eu mostrei No Logo de Naomi Klein, o que me dava assim um certo ar intelectual de esquerda. Acrescente óculos e cabelos grisalhos e sinta todo o poder da sedução. Como já tinha segurado no kimono e tinha dado um koka, resolvi ir mais além e arrisquei um yuko: você aceitaria tomar um café comigo? Ouvir aquele “claro que sim” me fez sentir melhor do que em quinze de terapia e muitos comprimidos terminados pam. Era tatame na certa. Finalmente.
 
“Papus-amenus” no café (dos 24 aos 48 anos acontece muita coisa), enquanto Thainá, digo, Gildete (caralho, Gildete é foda. E ainda por cima nem é nome de mulher séria), destruía o seu quinto bauruzinho e pedia duas cocadas e uma Pepsi Twist pra viagem, eu ficava pensando em como finalizar a parada. O jogo tava ganho, mas eu não sabia como empurrar a bola pra dentro. Sem duplo sentido. Nem precisei. Ai! Tive uma idéia. Eu moro aqui pertinho. Por que a gente não vai lá em casa assistir um DVD?  Meu Deus é muita bolinha pro meu pijaminha. Paguei a conta e partimos.
 
  No meio do caminho ela fez um pit-stop na sessão de eletrônicos, olhou pra mim com a carinha de anjo-neguinha mais meiga do mundo e disse: Ah! O DVD lá de casa estragou, agora que eu lembrei. Meu amigo, eu tava na cara do gol. Não ia ser um dvdzinho de duzentos conto que ia me impedir de provar daquela delícia.  Né não? Ai! Esqueci de te falar. Eu emprestei todos os meus DVDS para uma amiga. Posso escolher alguns pra gente ver?  Do alto da minha sagacidade comecei a achar estranho, mas, sabe comé que é né. Vai minha filha compra os DVDS.  Eu já tinha feitos as contas, mas o pacote todo tava dando menos que uma noite na balada.  Fui em frente. Até porque, ainda não tinha visto a retaguarda da mocinha, e vê-la caminhado assim por trás, mês fez ter vontade de comprar uma TV de Plasma, um Home Theater e um PS3.  
 
Voltou com um lindo sorriso nos lábios e uma pilha com vários DVD: Psirico ao Vivo na Casa da Mãe Menininha e Gleciane Arruda (será que ela é evangélica?) entre eles. Meu cartão VISA passou mais uma vez e finalmente partimos.  Paradinha rápida na banca para comprar um maço de Free Ultra Mega Turno Light, um cartão de recarga da Vivo, duas mariolas e uma paçoca (tá com verme, só pode), e finalmente chegamos ao local do combate.  Quarto andar, sem elevador. Puta que pariu!  Subi aqueles tantos degraus quase morrendo e ainda fazendo cara de atleta. No meio do caminho ela ainda perguntou se estava cansado, mas eu nem consegui responder, apenas sorri.
 
Olhando bem dentro dos meus olhos, no centro da sala diante da mesa, ela tocou meu rosto com as mãos (que mãos) e sugeriu com malícia: instala o DVD enquanto eu tomo banho. Já volto, prometo (sendo que esta parte ela falou bem baixinho). Aquele cabelo molhado era a coisa mais linda que eu já tinha visto na vida. Aquele roupão da Fricote escrito 100% maravilhosa não fazia nenhuma  justiça ao que eu estava vendo. Ficou assim me olhando da porta do quarto e disse: vem cá! Esqueci por completo meu passado de ateu e pensei: Deus é mais.  Já encontrei o roupão no chão e só me lembro daquela boca (que boca) dizendo assim: deita aqui comigo. Fazer o que, né. Deitei. Entre o deitar e o tempo que ela levou para abrir a gavetinha do criado mudo, pegar camisinha, abrir com a boca, instalar a bicha e simular o orgasmo passaram-se, no máximo, dois segundo. A mulher parecia um Ninja Kung Fu. Tamanha habilidade e rapidez me fizeram pensar que ela exercia esta atividade com alguma freqüência. Mas a dúvida sucumbiu na relação custo-benefício.
 
Pega meu cigarro pra mim amor (amor, que porra é essa). Acendeu, deu no máximo duas tragadinhas, apagou e disse: encosta a porta quando sair tá meu amor (de novo?). Me liga tá meu lindo.  Ligar pra onde sua doida?  Eu ia perguntar se a gente tava namorando, mas nem deu tempo. Gildete caiu no sono. Fiz uma conta rápida e descobri que minha tarde amor literário tinha me custado mais de 300 reais, menos os dez conto que roubei da carteira dela pra pegar o ônibus e voltar pra casa humilhado. Humilhado, mas feliz e com a curiosidade saciada. Minha teoria estava certa. Gildete é filha de pai Gilberto e mãe Bernadete. Eu Sabia.
 
Ainda cometi um ultimo gesto ingênuo antes de ir embora. Deixei um bilhete e o numero do meu telefone. Você ligou? Nem ela. Que ligou foi o Gilsinho e com a uma voz de felicidade ao extremo disse: mermão, se eu te contar o que me aconteceu na livraria aqui perto de casa... você num vai acreditar.
Piranha filha da puta!